sexta-feira, 30 de maio de 2014

Nadadeiras

- São nadadeiras, amor da mamãe.
- Não são isso! São braços!
- Bruninho, peixes não têm braços. "Isso" são nadadeiras. Elas se movem e os peixes nadam.
- Já vi você nadando, os seus braços também se movem e você nada. São nadadeiras, por acaso?

- Eu não sou um peixe...
- Por isso mesmo você não tem o direito de chamar os braços deles de nadadeiras. Egoísta!

Conversa, em certo momento passado, bem passado, entre um Bruno teimoso e uma mãe risonha, na frente de um aquário. Foi ela mesma quem me lembrou dessa conversa, pelo telefone, dia desses. E, claro, como uma lembrança traz outra que traz outra e outra, você atravessa a noite a recordar. E quanta coisa há para recordar...
Mas, bem, esse breve texto não foi feito com intuito didático de validar a recordação como fundamento primordial da vida. Na verdade ele não foi feito com intuito nenhum. Sequer foi feito, ele surgiu do limbo. Talvez numa tentativa de explicar as nadadeiras da vida. Ou pra Nada. Deiras.
Deira é o nome do que foi um antigo reino da Inglaterra, por volta dos anos 500 e alguma coisa. Ao que me consta, parece que o nome é de origem Bretã e pode significar "carvalho" ou então "águas". Isso me lembra uma canoa de madeira no mar. Lembra, também, um pedacinho de madeira (não me recordo o nome daquilo) que vovó mergulhava em um copo cheio de água, deixando de molho por algumas horas e bebendo, depois, por mais algumas horas. Segundo ela, isso amenizava enjôo e curava outro tulhão de doenças. Amargo como ficava, aposto que até defunto aquilo era capaz de reviver.
O fato é que um pé de carvalho pode viver por até 2000 anos e a água, bem, sabe-se que ela foi uma das primeiras coisas a existirem neste planeta. Daí me pego pensando em algo como o carvalho através dos tempos. Ou através das águas. E depois surgiram os peixes com seus carvalhos, cortando os mares e oceanos. Aliás, quem nasceu primeiro, o peixe ou o carvalho? 

A vida é como um carvalho. E as águas são como a vida. Você usa a vida pra atravessar a vida. De repente chega a morte. É um raio no carvalho no meio do oceano. Fogo. Nunca deram certo, não é? O fogo e a água. Quando as coisas começam a esquentar, todos fogem ou então alguém joga um balde de água fria. É sempre assim, no ápice dos acontecimentos, que tudo acontece. Ou deixa de acontecer.
Mas a água sempre vai viver mais que o carvalho. Então a água representa a vida e o carvalho, o viver. Ele é, mesmo, as nadadeiras. É o que impulsiona, o que empurra, o que navega. Você escolhe a intensidade com a qual vai nadar e qual a direção, mas, vivendo ou morrendo, a água continua. Inundando. A vida tem de ser mesmo infinita. É por isso que temos coração e sentimento: um morre, o outro, que sempre pareceu intrínseco, perpetua e passa de geração em geração, sem nunca ser esquecido.
Ou é tudo isso ou... 

Nada.
Deira.


Nenhum comentário:

Postar um comentário